sábado, outubro 07, 2006

Lula e Rosengana Sarney

Várias pessoas me indagaram, indignadas, com razão, sobre a aliança Lula & Sarney. As linhas que aqui seguem são o resumo da minha opinião sobre o caso. Não se trata de uma justificativa, pois os argumentos que poderiam ser utilizados com esse objetivo, pelos defensores da aliança, não têm validade para mim.

Em primeiro lugar, devemos lembrar que, para o bem e para o mal, existe muito mais complexidade no campo político do que retrata a mídia nossa de cada dia.

No Congresso Nacional, o governo Lula tem ao seu lado, incondicionalmente, apenas as bancadas do PT e do PCdoB. Um total de 93 deputados (do total de 513 na Câmara) e 13 senadores (entre 81 no total). Com esse contingente, menos de 20% das duas casas, o governo não poderia aprovar qualquer projeto e seria facilmente posto de joelhos.

Majoritariamente, o Congresso é composto de parlamentares conservadores, contrários à necessária e desejada transformação das estruturas sociais do país, para que tenhamos uma nação justa e digna.

José Sarney, prócer da ditadura militar, é reconhecido como uma das maiores, senão a maior "raposa" da política brasileira. Não há qualquer dúvida de que ele e sua oligarquia representam o que
de mais atrasado e anti-democrático na história da República. Paternalismo e clientelismo nas relações com o povo, truculência (simbólica e física, ainda que velada) com opositores, nepotismo e apropriação do espaço e patrimônio públicos (basta fazer um passeio pela capital São Luís e constatar) são algumas marcas do clã Sarney.

Apesar de e com tudo isso, o senador do Amapá (?!) é um dos caciques mais influentes do PMDB e de todo o cenário político nacional. Obviamente, para se manter dominante em seu "feudo", o senador precisa garantir suas benesses na cúpula da República. Daí que sempre esteve ao lado dos governantes da hora. Foi aliado de Collor, Itamar e F(MI)HC, até o escândalo Lunus. Como se diz na gíria, não quer "largar o osso" e aposta no carisma e na vitória de Lula para revigorar o seu poder local e, ao mesmo tempo, garantir seu espaço privilegiado na corte palaciana.

Sob nenhum ponto de vista Sarney é um aliado desejável ao PT e a Lula. Porém, é necessario para qualquer a composição de forças no Congresso,
principal arena política da nação.

Anteontem (sexta-feira), em comício no interior de Pernambuco, Lula fez um elogio a JK e acabou, pelo que não disse, fazendo uma crítica indireta ao ex-presidente. "O último [presidente] que lembrou do Nordeste foi o presidente Juscelino Kubitschek. O Nordeste só serve na época de eleição, depois viram as costas". Se ponderasse mais, talvez Lula acrescentasse à declaração o presidente da moratória e da hiperinflação. Apesar de ter sido uma consideração bastante pontual, a espontaneidade acabou revelando mais verdade do que Lula poderia (e gostaria de) dizer.

No Maranhão, a oligarquia está cada vez mais enfraquecida. Perde fôlego tanto por suas falhas quanto pelos acertos e vitórias da oposição. Ainda assim, é importante lembrar que o clã Sarney domina a Justiça e várias outras instâncias do aparelho de Estado, como o Tribunal de Contas, cuja sede se localiza num prédio batizado de "Palácio Roseana Sarney Murad". Equivoca-se, portanto, quem pensa que a derrota a presente eleição enterrará a oligarquia.

A aliança com Sarney, para Lula, é tática, e não estratégica. Com o segundo mandato, como se espera, sinalizando uma guinada à esquerda, principalmente na política econômica, será possível prescindir de aliados "inconvenientes" como Sarney, trocando-os pelo apoio de base popular - a sociedade civil mobilizada em torno do avanço do projeto de superação da hegemonia neoliberal - algo que, certamente, não acontecerá com a dupla PSDB-PFL no poder central.

Se é previsível que a vitória de Lula pode preservar a força do senador Sarney, não é menos provável que a vitória de Alckmin implicará apenas a necessidade, por parte do patriarca do clã, de uma renegociação junto aos cardeais tucano-pefelistas para que ele lhes preste seus serviços.

Com Lula, apesar e com todas as contradições, teremos a possibilidade e o espaço para pressionar, cobrar e disputar internamente por avanços democráticos para o país. Com Alckmin, é certa a volta da criminalização e da violenta repressão a todo o conjunto de entidades e movimentos sociais, visto que a ideologia fascistóide da dupla PSDB-PFL não reconhece a legitimidade das
organizações populares como interlocutores políticos. Os jovens esquerdistas que não militaram na era F(MI)HC - e hoje apontam o governo Lula como "de direita" - não tem a mínima noção do que isso significa.

Portanto, a opção mais coerente é derrotar "Rosengana" Sarney nas urnas e eleger Lula, de modo que Sarney ficará fragilizado diante de uma derrota em seu próprio estado.

Por último, mas não menos importante, não deixa de ser constrangedor, revoltante e entristecedor, para qualquer petista ou simpatizante do Partido dos Trabalhadores, o anúncio dessa aliança. Porém, sabemos que, por mais dolorido que seja, às vezes é necessário dar um passo para trás para em seguida darmos dois à frente.

PS: Em tempo, a despeito do apoio de Lula, o PT do Maranhão não vai fazer campanha para Rosengana, mas sim para Jackson Lago (PDT). E Lula, com seus botões, sabe que isso é o correto.

1 Comments:

At 8:41 PM, Blogger Unknown said...

Parabéns pela iniciativa.

 

Postar um comentário

<< Home